Dados preliminares do IBGE revelam que a agropecuária acompanhou, em tempo real, mudanças tecnológicas na produção e na comunicação, e viu o aumento da participação de pessoas da terceira idade e de mulheres na gestão de propriedades. - Diene Batista, especial para a Revista Campo

Em Goiás há mais de três décadas, o produtor Gernot Ingo Streit, 59 anos, gaúcho de Passo Fundo, conta com a ajuda da tecnologia e, mais recentemente, das filhas para a gestão da propriedade em Cristalina, no Entorno do Distrito Federal. Aos 77 anos, o produtor Fernando Ceresa Neto, de Piracanjuba, no Sul do Estado, faz da paixão pelas atividades rurais, herdada do pai, o combustível para a lida diária com a pecuária leiteira. Já em Bela Vista, na região Metropolitana de Goiânia, a advogada Marcela Caiado, 33, investiu há três anos no plantio de bucha vegetal, e seguindo os passos dos pais, concilia a atividade agropecuária com outra profissão. Gernot, Fernando e Marcela representam o novo retrato do campo, revelado pelos dados preliminares do Censo Agropecuário 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE). Mais produtivo e tecnológico – na esteira das transformações que afetam toda a sociedade – o agronegócio brasileiro também está mais feminino e experiente. A participação de mulheres e de pessoas de 60 anos ou mais na direção dos estabelecimentos aumentou, chegando a, respectivamente, 18,6% e 21,41%. Em 2006, ano em que o levantamento havia sido realizado pela última vez, as mulheres representavam 12,7% dos produtores e os idosos, 17,52%. Especializada no segmento rural, a advogada Marcela Caiado cresceu vendo o pai, um dentista, trabalhar com pecuária. Há três anos resolveu seguir seus passos e em uma gleba na Fazenda da Maré, em Bela Vista de Goiás. Ela e a mãe tocam uma pequena lavoura e uma micro indústria de bucha vegetal: a Quintal da Mata. “Sempre fui muito ligada ao meu pai e à gestão desde cedo. Frequentei leilões, aprendi com ele a ver gado ‘no olho’”, recorda, citando sua vocação para a agropecuária. Além da afinidade com o campo, Marcela também buscou formações para minimizar as barreiras enfrentadas pelas mulheres na atividade rural. “É possível sobreviver nesse meio. Participei de vários cursos oferecidos pelo Senar e foi essa base que me ofereceu o maior diferencial sobre meus colegas e concorrentes que, em sua maioria, não tiveram essa preocupação”, analisa, frisando a importância da tecnificação.

Tecnologia e paixão.

Assim como a advogada, o produtor rural Fernando Ceresa Neto viu a paixão pelo campo despontar em família. Paulista da região de Sorocaba, ele se estabeleceu em Piracanjuba no final da década de 1970. “Comecei tirando leite de cinco vacas, tirando 20,30 litros. Fomos aumentando e hoje produzo uma média de 6.100 litros por dia”, compara ele, que hoje tem um plantel com cerca de 600 cabeças de gado, metade em lactação, na Fazenda Boa Esperança, Sul de Goiás. Aos 77 anos, Fernando faz parte de um grupo que cresceu, segundo o Censo Agropecuário 2017: o de gestores rurais com 60 anos ou mais. No Brasil, eles representavam 34% dos produtores entrevistados. Em Goiás o porcentual com agropecuaristas com este perfil subiu para 41%. “Está arraigado esse gosto do brasileiro pela terra. Em São Paulo, meu pai tinha um sítio. Depois ele vendeu, foi para outra atividade, mas isso fica entranhado na gente. E acabei voltando para a terra”, conta Fernando, que vive com a esposa, Maria de Santo Afonso Ceresa, 72 anos. Hoje, Ceresa tem a tecnologia como aliada para melhorar o manejo da propriedade e dos animais. “Sem isso, não conseguiria administrar sozinho um rebanho deste tamanho”, analisa. Destaque para a ordenha mecanizada, que permite acompanhar em tempo real a produção leiteira de parte do rebanho. Ele também está construindo um sistema de confinamento de vacas leiteiras denominado de Compost Bar, que visa aumentar a produção e sanidade do rebanho.

Experiência e juventude

O analista técnico do Instituto para o Fortalecimento da Agropecuária de Goiás (Ifag), Cristiano Palavro, explica que é crescente o número de filhos que acompanham os pais na atividade rural. “Eles se tornam parte da mão de obra da propriedade, porém, concentrando as decisões no patriarca ou na matriarca da família. Os jovens estão muito presentes no campo e são, muitas vezes, a mola propulsora da tecnificação, trazendo novas ferramentas e tecnologias”, explica, citando que a diminuição na diferença entre número de homens e de mulheres que se dedicam ao campo também é uma tendência para os próximos anos. É o que acontece com o produtor Gernot Ingo Streit, 59. A tecnologia, especialmente o maquinário moderno, o ajuda na gestão da Fazenda Minuano, em Cristalina, no Entorno do Distrito Federal. Ele está na atividade há mais de três décadas e cultiva soja, milho, feijão e hortifrútis usando em uma parte da propriedade, há 15 anos, a irrigação. “Isso otimiza a produção, temos mais produtos durante o ano para vender”, diz. No Brasil, o uso de métodos de irrigação cresceu 52% segundo o Censo 2017 em relação ao levantamento realizado em 2006. No último ano, 502.425 estabelecimentos agropecuários brasileiros disseram usar esse tipo de tecnologia, enquanto o total da área irrigada no país foi de 6.903.048 hectares. No mesmo período, 408 mil tratores foram incorporados em 200 mil estabelecimentos – um aumento de 50% que elevou a frota do país a 1,2 milhão de unidades. “As maquinas melhoraram muito na última década, ajudaram a aperfeiçoar o plantio e a condição de trabalho no campo, como tratores, pulverizadores, que são ferramentas que mais usamos na fazenda”, ilustra Gernot. Há setes anos, Gernot passou a contar com a ajuda da filha Gabriela Neto Streit, 31. Agrônoma por formação, ele ajudou a desenvolver na propriedade procedimentos voltados para a preservação ambienta, como o de aproveitamento de lixo orgânico. Além do auxílio há quatro anos Gabriela também passou a investir no plantio de cebola e hortifrútis. “No começo, havia algumas diferenças [de pensamento]. Tem o lado do respeito, pela experiência do meu pai, depois, fomos amadurecendo, conversando. Ao longo desse tempo, conseguimos construir várias coisas interessantes”, comenta. Desde fevereiro, outra filha, Jéssica Streit, 26, também passou a atuar na propriedade. Recém-formada em Engenharia Ambiental, ela transformou seu trabalho de conclusão de curso em um projeto para ser aplicado na Fazenda Minuano. “Recuperamos uma área da propriedade, plantando mudas nativas do Cerrado. E pretendemos continuar, a cada ano, para recuperar uma nascente”, explica.

Setembro/2018 | Campo n°. 277