Marcela Caiado Advogada especialista em Agronegócio, membro das Comissões de Direito Agrário e do Agronegócio da OAB/GO, membro da União Brasileira dos Agraristas Universitários e Secretária-adjunta do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável de Bela Vista de Goiás

Muito tem se falado a respeito das devoluções das diferenças pagas em financiamentos garantidos por Cédulas Rurais em vigência à época da instauração do Plano Collor, mas o fato é que Brasil a dentro o que se vê é a total desinformação sobre a questão dos produtores rurais e titulares desse direito.

Como já dizia Rui Barbosa, a justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionalizada, mas o fato é que, finalmente, 17 anos após amargar terríveis prejuízos pela implementação do Plano Collor I, em março de 1990, produtores rurais que tiveram seus contratos de financiamento ilegalmente reajustados começam a sentir o sabor da reparação dos danos provocados pelas malfadadas medidas de controle da hiperinflação que assolava o Brasil na década de 1980.

Em sessão realizada em dezembro de 2014 o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar Recurso Especial em Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) tendo como assistentes a Sociedade Rural Brasileira (SRB) e a Federação das Associações de Arrozeiros do Estado do Rio Grande do Sul (Federarroz) contra a União, o Banco Central do Brasil (BC) e Banco do Brasil (BB), reconheceu a ilegalidade cometida pelo BB, por determinação do BC, quando reajustou todos os contratos de financiamento rural lastreados em recursos da caderneta de poupança, por índice ilegal, impondo a todos os agricultores contratantes uma dívida indevida.

Para melhor esclarecimento, o que aconteceu em março de 1990, foi que o BB, ao receber o Comunicado do BC, utilizou o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) para atualização dos saldos em cruzeiros nas poupanças, adotando um sistema misto na correção dos saldos das cadernetas: saldos em cruzados, utilizavam-se a correção A ação a ser proposta não discutirá validade da cláusula do contrato firmado junto à instituição financeira Divulgação pelo Bônus do Tesouro Nacional (BTNF); já os depósitos em cruzeiros aplicou-se IPC.

Ocorre que o custeio dos respectivos financiamentos se dava pelos aportes das contas poupança que todos os produtores eram compelidos o abrir junto ao banco, para a emissão da cártula. Desta forma, confirmando o posicionamento já consolidado pela jurisprudência, o STJ reafirmou que o índice de correção monetária aplicável às cédulas de crédito rural, no mês de março de 1990, nas quais previam indexação aos índices da caderneta de poupança, deveria ter sido a variação do BTNF e condenou os réus ao pagamento das diferenças apuradas entre o IPC de março daquele ano (84,32%) ou o que foi estabelecido pela Lei 8.088/1990 (74,60%) e o BTNF fixado em idêntico período (41,28%).

Essa decisão possui o chamado efeito erga omnes, o que quer dizer que beneficia todos os produtores rurais que mantinham contratos de financiamento agrícola junto ao BB e tiveram os reajustes ilegais ora afastados, por meio de ação judicial própria. Vale registrar que a ação a ser proposta não discutirá validade da cláusula do contrato firmado junto à instituição financeira, mas apenas a apuração dos valores que cada mutuário tem direito e seu respectivo recebimento.

Atualmente, as ações dessa natureza encontramse sobrestadas pois aguardava-se decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário /SE, que finalmente foi publicada no último dia 25, a respeito dos critérios de cálculo nos casos excepcionais em que a União vier a ser obrigada. Na prática essa decisão liberará o prosseguimento das ações sobrestadas e permite ao produtor cobrar judicialmente os valores a serem finalmente restituídos.

Outubro/2017 | Safra n.º 45

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